O desenvolvimento econômico sustentável da região de Vila Bela da Santíssima Trindade e a proteção do Parque Estadual Serra Ricardo Franco (PESRF) correm grave risco caso o Projeto de Lei 02/17, que extingue o parque, seja aprovado esta semana na Assembleia Legislativa de Mato Grosso. Tudo indica que pode estar na ordem do dia da sessão desta quarta-feira (11) para a derradeira 2ª votação.
Com a maior parte dos deputados sinalizando para sua aprovação, apenas a perspectiva de produtores rurais é considerada. Os parlamentares ignoram o potencial turístico da região, esta sim, que beneficia a população num todo.
Estudo realizado sobre o potencial turístico do parque demonstra que a perda econômica vai ser, no mínimo, duas vezes maior que a renda gerada pelo agronegócio. Enquanto a extinção representa uma perda entre R$ 18,7 milhões e R$ 56,2 milhões, em relação ao segmento do turismo, estima-se que os retornos adicionais com a expansão da pecuária sejam de R$ 9 milhões anuais. O estudo demonstra que somente em termos de visitação, o valor potencial perdido ultrapassa R$ 19 milhões/ano. O levantamento de 2018 por pesquisadores associados – e conduzidos por Carlos Eduardo Frickmann Young, consta no livro ABC do Guaporé: Água, Biodiversidade e Biotecnologia, que é fruto do trabalho de uma equipe de 62 pesquisadores.
Ainda segundo a publicação, a expansão das pastagens acarretaria aumento da erosão, com perda de solo maior que 200 mil toneladas/ano, e emissão de mais de 8 milhões de toneladas de CO2. Por fim, o levantamento conclui que não há justificativa econômica para a extinção do PESRF, pois os benefícios perdidos superam, em muito, os ganhos esperados com o avanço da pastagem possibilitado pelo fim do Parque Estadual Serra Ricardo Franco.
Com 158,6 mil hectares de extensão, a unidade de conservação foi criada em 1997, uma das mais antigas de Mato Grosso. Abriga centenas de cachoeiras e piscinas naturais de água cristalina. Por estar localizado em uma zona ecótono entre três biomas distintos, Cerrado, Pantanal e Amazônia, o PESRF apresenta uma enorme diversidade de vegetação e fauna.
Em 2016, a Secretaria de Meio Ambiente do Estado (SEMA) considerou o PESRF como o parque estadual com maior potencial turístico e mesmo depois de quase 20 anos após a sua criação, a UC ainda não possui um plano de manejo. O parque está inserido no município de Vila Bela da Santíssima Trindade, com inúmeras riquezas históricas e arqueológicas que também agregam à atratividade turística da região.
O parque faz fronteira com a Bolívia, em uma região próxima ao Pantanal do Guaporé. Além disso, possui cenários belíssimos que atraem turistas do mundo todo, como a mais alta cachoeira de Mato Grosso, a Cachoeira do Jatobá e o cânion homônimo de águas azuis. Existem cerca de 2 mil nascentes no município de Vila Bela, no entanto, conforme levantamento do Mapbiomas, o município está entre os que mais perderam superfície de água no Brasil.
Manobra no Legislativo Estadual
No dia 4 de outubro, mesmo dia em que as atenções estavam voltadas para o Senado, onde o PL da Estadualização do parque de Chapada dos Guimarães corria o risco de ser aprovado, a ALMT surpreendeu com a retomada da tramitação do Projeto de Decreto 02/17, que busca suspender os efeitos do decreto de criação (n.º 1.796/1997) que criou o Parque Estadual Serra Ricardo Franco.
O PDL – que não precisa de sanção do governador – não estava na pauta, mas de repente, despontou nesta sessão de quarta-feira (4), sob condução do deputado ruralista Gilberto Cattani (PL), que requereu subitamente o retorno da pauta em regime de Urgência Urgentíssima na tentativa de aprová-lo no mesmo dia.
Por sua vez, o deputado Lúdio Cabral (PT) votou contra, alertando sobre a pressa. Por sorte, com a falta de quórum qualificado para votação, seu questionamento venceu e Cattani não conseguiu emplacar a votação. O requerimento teve aprovação de 15 parlamentares. Isso quer dizer que eles apoiam a extinção da unidade de conservação estadual de valor inestimável, cujo fim interessa a produtores rurais do município que enfrentam uma série de ações judiciais em decorrência de crimes ambientais.
Em Mato Grosso, o Observatório Socioambiental de Mato Grosso (Observa-MT) acompanha a tramitação do Projeto de Decreto Legislativo desde o início de sua tramitação. A rede formada por organizações socioambientais que atuam no Estado elaborou uma nota técnica de alerta sobre a inviabilidade jurídica da proposta. Acesse aqui.